Juliana Capibaribe - Artista e pesquisadora.
Aline Albuquerque - Integrante do Lamur, artista e participante da pesquisa IntenCidades
Rafaela Kalaffa - Participante da pesquisa IntenCidades e mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Bahia.
“(...) Em outubro de 2014, foi realizado o segundo ConversAções¹ com as artistas|pesquisadoras Juliana Capibaribe e Aline Albuquerque, que à época era mestranda no PPGArtes ICA|UFC e participante da pesquisa IntenCidades. Ambas as convidadas demonstraram interesse pela relação casa e rua, memória afetiva e espaço urbano. O encontro teve mediação de Rafaela Kalaffa e contou com cerca de vinte participantes. Aline apresentou o seu endless work (trabalho sem fim) em dois prédios abandonados no bairro Vicente Pinzón, perto do quarteirão onde mora. Apelidados por ela de “predinho” e o “predião”, fazendo referência às diferentes alturas dos prédios inacabados, Aline passou a observá-los primeiramente como uma curiosa, com o desejo de conhecer modos de viver e habitar o urbano. “Negociou” sua entrada com vigias, trabalhadores da construção civil que usavam o prédio como lugar de repouso e com usuários de drogas.
Com pincéis e tinta, desenvolveu, principalmente no “predinho”,
uma relação de presença e intervenção visual com stencil, tecidos
e miçangas. Fotografando essas intervenções, constituiu a experiência “O ornamento é uma aventura errante” que desenvolveu como pesquisa de mestrado no PPGArtes ICA|UFC.
No ConversAções, partilhou sua relação com a estrutura de concreto aparente e suas intervenções de ornamentos coloridos, que recriavam o espaço. Amparada com as imagens de seu trabalho (como a que se segue), Aline falou da relação cotidiana de estar e ocupar esse espaço, a proximidade com a sua casa e o con
tato com marido e filhos; de ver a cidade em horizonte aberto; ver o “predinho” a partir de sua cozinha. Ao desbravar a vizinhança e falar com estranhos, inventou jeitos de habitar e fazer a cidade.
Juliana Capibaribe abordou a sua relação com a cidade de Fortaleza, especialmente o centro da cidade, ocupado por pessoas de movimentação acelerada e por pessoas que param para observar, num tempo próprio, singular. Com um olhar sensível à memória afetiva de sua infância, de tempos de cidade pequena, Juliana criou uma personagem mobilizando o cafuné e a reza, o chapéu de palha e a presença questionadora no espaço público como uma espécie de vandalismo. A Rezadeira Vândala é construída, na concepção de Juliana, como uma dramaturgia do cotidiano. Transitou em percurso pelas praças do centro de Fortaleza, com um produto de comércio inusitado: vendeu cafunés – três minutos de cafuné por dois reais.
Como rezadeira, Juliana compôs rezas que remetiam a histórias da infância e sensíveis descobertas do corpo, cadenciadas com gestos de suas mãos e olhares. Entoava suas rezas para pessoas e para árvores, construindo uma interseção entre performance e ritual, entre o íntimo/privado e o público, e objetos de casa e de rua.
Juliana também partilhou de um acontecimento “vândalo” da Rezadeira, quando pixou uma frase de stencil numa lixeira da Praça do Ferreira, no Centro de Fortaleza. A frase orientava que as pessoas jogassem lixo na lixeira, e foi repreendida por policiais.
Nesse segundo ConversAções, realizado à noite numa rua movimentada, no jardim da Casa do Barão de Camocim, citado anteriormente, fomos levados a incorporar os sons de buzinas e motores de veículos às falas das artistas convidadas; assim como, no primeiro ConversAções, a ocupação de parte do pátio do Departamento de Arquitetura e Urbanismo enfrentou dificuldades, inclusive, sonoras, justo por estar acontecendo dias antes da inauguração oficial do espaço e durante a realização de aulas. São apenas algumas das singularidades de construir o espaço-tempo comum de cada experiência proposta. “Estar junto” na universidade e na cidade não é consenso, não é permanente, não é (e não pode) ser eliminador de diferenças; é, pelo contrário, efêmero, é singular, foge ao planejado, pode causar tensões, atritos e conflitos – pode e deve desagradar, pelo bem da democracia, poderíamos afirmar com Chantal Mouffe (2007). (...)”
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¹ Texto de apresentação do ConversAÇÕES compõem o artigo “ConversAções: encontros entre as artes, a cidade e a universidade” de autoria de Deisimer Gorczevski e João Miguel Diógenes de Araújo Lima publicado na Revista Vazantes, v. 1 n.2 (2017). Mais detalhes estão disponível em: